Capítulo 5 Capitulo V

É de se notar de longe meu mal humor pela carranca de poucos amigos com que chego no edifício da empresa. Agradeço silenciosamente quando ninguém se aproxima no caminho entre o subsolo e o vigésimo andar para tentar puxar o assunto que fosse. Eu sei, não tem nada a ver ficar remoendo algo que ela sequer deu chance de ser possível, mas infelizmente, nesse pouco tempo eu já tinha ficado iludido o suficiente para pensar que pudesse acontecer finalmente o que eu tanto desejo.

Que idiota que eu fui, meu Deus. A menina não fez nada além de ser gentil o tempo todo. E eu não fui nada além de alguém que deu suporte em seu momento de fragilidade. É um fato!

As porta do elevador se abrem, e caminho apressado para minha sala. Neste meio tempo, Leila apenas me olha e deixe que eu faça meu percurso sem interrupções. Entro em minha sala batendo a porta com força. Jogo minhas coisas na mesa de qualquer jeito, e me jogo na cadeira de couro giratória.

Em segundos, minha secretária entra devagarinho.

- Bom dia! Devo autorizar alguém ou ninguém passa?

- Apenas o Steven, por favor. Ah, poderia me trazer um café bem forte e sem açúcar? Agradeço, principalmente se já puder ir.

A pobrezinha assente saí.

Fui grosseiro além do limite, vou pedir desculpas quando ela voltar.

Leila trabalha pra mim tem cerca de cinco anos. Havia recém saído da faculdade e procurava um estágio ou o que fosse para bancar os custos de morar sozinha. Sempre admirei muito sua garra e por isso, lhe dei uma chance. Desde então, jamais me arrependi dessa escolha. É morena, tem lá seus 1.60m de altura e generosas curvas que levam a delírio os demais funcionários daqui. Eles realmente babam nos pés dela. Tem os olhos cor meu e sempre se veste com muito recato e bom gosto.

E não, jamais passou pela minha cabeça ter algo além do profissional com ela. Certo, já me envolvi com algumas secretárias, como foi o caso de Katherine, mas nunca com Leila. Ela tem algo que me lembra muito minha irmã.

Passo as mãos nos cabelos como forma de organiza-lo, e encaro o enorme janelão a minha frente. A vista que ele me possibilita é esplendida. O vidro vai do chão ao teto e me permite vislumbrar a cidade inteira. O Rio é realmente lindo.

- É ela, não é?

Me assusto com a voz de Steven e viro bruscamente.

- Do que você esta falando? - questiono ao me recompor, mantendo a cara de desentendido.

- Talvez da Katherine, lembra que ela... Óbvio que da filha da Carla, cabeção.

Me ajeito melhor na cadeira já desconfortável com o rumo da conversa.

- Ela já tem alguém. Um noivo, pra ser mais exato. Então, está totalmente fora de questão.

Ele continua me olhando fixamente, como se procurasse bem lá no fundo por um fio de mentira em minhas palavras.

- Acha mesmo que vou cair nessa, que você não vai insistir por ter alguém no caminho? Conta outra Lucas! Já vi você fazendo coisas bem piores por muito menos. - desdenha vindo sentar-se a minha frente.

Intimidade é mesmo uma droga, deixa a verdade escancarada sem lhe dar ao menos a chance de esconder lá.

- Apenas quero uma coisa dela. E você já deve saber o que é. Ruth é perfeita, todas as características.

Ele revira os olhos.

- Vai insistir nesse assunto cara, sério!? - Solta um ar pesado.

- Nunca desisti de algo assim tão fácil, não vai ser agora. Mas enfim, esse assunto fica pra uma outra hora, temos coisas mais urgentes pra resolver. - Pego uns papeis decidido a mudar de assunto por hora.

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Já passavam das 17h quando cansei de tanta papelada e decidi ir embora. Abraçar essa empresa com mãos e pernas está custando toda a minha sanidade, saúde e juventude. Afinal, daqui a pouco completo três décadas, uma e meia dedicados a engrandecer cada dia mais os negócios da família. Mesmo cansado, reuni o que me sobrava de coragem e dirigi rumo ao hospital. Minha cabeça a todo momento girava em torno da possibilidade de Ruth aceitar ser minha barriga de aluguel.

Será que ela acharia loucura demais da minha cabeça, ou abraçaria a ideia de mente aberta?

Com os pensamentos a mil, estaciono próximo a entrada do hospital. Após me identificar na recepção, sigo caminho para o quarto de Carla.

Encontro-a sozinha, sorrindo diz que a filha passou mais cedo e que só volta amanhã, pois foi aproveitar a estadia curta do noivo.

Reprimo a vontade absurda de revirar os olhos.

Relaxe, ela não é sua propriedade, tampouco alguma coisa sua.

Conversamos um pouco sobre como está sendo a rotina tanto lá de casa sem sua presença, quanto dela que reclama por estar presa aquela cama de hospital. Conforme o papo vai fluindo, noto que está bastante cansada. Prometendo voltar no dia seguinte com Melinda e talvez Steven deixo que descanse. Dou-lhe um beijo casto no dorso da mão e em sua cabeça antes de sair, e espero que esteja quase pegando num sono para me retirar silenciosamente. Com isso, sigo meu caminho até o estacionamento calmamente.

Estava quase alcançando meu veículo, quando vejo que tem alguém encostado nele. Devido a baixa luminosidade e por estar quase anoitecendo, não consigo ver com exatidão quem seja, tomando como justificativa ser apenas alguém que esteja aguardando um amigo ou coisa do tipo. Estranhamente, não consigo tirar a atenção para saber quem seja. Não consigo descrever o tamanho do meu desdém quando finalmente decifrei de quem se tratava.

- Eu sei bem qual é a sua, Lucas Weber. Acha que sou algum otário? - questiona em tom de zombaria apontando o dedo indicador na minha cara.

- Primeiro, tire esse dedo da minha frente antes que eu o quebre em pedacinhos e os enfie todos na sua boca. Não lhe dei o direito ou intimidade para que se dirija a minha pessoa nesse tom. Segundo, se tem algum assunto pendente comigo que eu acho difícil, vá direto ao ponto que quem gosta de rodeio é peão.

Mesmo a contragosto, Matias foi baixando a bola aos poucos, com o semblante de puro ódio.

- Você acha mesmo que eu cai nesse seu papo de chefe solidário? Faça me o favor, essa ladainha não cola. Você quer ela, eu sei disso.

Respiro fundo e conto até dez mentalmente por diversas vezes, já que minha real vontade é quebrar toda a cara dele e não só o dedo que ele insiste em me apontar.

- Acho bom você tomar bastante cuidado com o que diz, acusações desse tipo podem te levar a perca de alguns dentes na boca. - rebato ríspido de frente, e ele recua.

Tal qual carro velho, apenas arranca e ilude o dono.

- Eu não vou dizer duas vezes, mantenha distância dela, caso contrário, não respondo por mim. - Ameaça, antes de me dar as costas e sair. Entra em um Kia Cerato preto que o aguarda a poucos metros daqui e vai embora. Típico de filhinho de papai mimado.

Agora mais do que nunca, vou investir com jeitinho pra que Ruth aceite minha proposta.

Entro em meu carro possesso de raiva, pisando fundo no acelerador em seguida. Resolvo por não ir pra casa de cara e nesse estado, quero espairecer. A primeira imagem que vem na minha cabeça é a praia, o lugar perfeito para colocaras ideias no lugar.

Paro próximo a orla, rente ao calçadão. Nesse horário não tem muito movimento como pela manhã de banhistas e afins, me permite caminhar um pouco sem grandes interrupções.

A brisa, o vai e vem das ondas fazem com que meu corpo relaxe gradativamente. Fecho os olhos e respiro profundamente ao sentar na areia fria. Abro aos poucos, e me ponho a admirar o horizonte.

Tenho certeza que Ruth é a mulher ideal para me dar um filho, mas não quero que ela me ame ou que fiquemos juntos. Quero apenas que tenhamos um fruto que tecnicamente nos unirá pro resto da vida indiretamente. Ou melhor, ela me dá e vai embora. Ela não precisa se tornar mãe se não quiser.

Será que assim fica melhor dela aceitar?

Depois de um bom tempo matutando sozinho, levanto e faço meu percurso de volta para o carro.

...

Ao chegar em casa, estranho o fato de estar tudo tão calmo por aqui. Simplesmente não consigo me acostumar com isso. Deixo as chaves de casa e do carro na mesinha de entrada, e subo as escadas para o quarto de Melinda. Após três batidas sem obter resposta, aceito o fato de que estou sozinho em casa.

Talvez ela não tenha saído da faculdade ainda.

Giro nos calcanhares e volto pra sala, me sentando um pouco em uma das poltronas dispostas ali para aproveitar um pouco do silêncio que a solidão me obriga aguentar. Saco o celular do bolso, e confiro alguns e-mails. Mais uma vez, Ruth me vem a cabeça.

O único jeito dela aceitar isso sem sentimentos, é se eu for o CEO frio que meu pai tanto sonha que eu seja.

E que eu finjo a todo momento ter aprendido direitinho.

            
            

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