Sempre achei que havia algo de diferente comigo. Todos ao meu redor já sentiram o despertar da natureza animalesca que os habita. Os ômegas ficam estranhos, sensíveis demais, sentem e emanam cheiros quando estão para entrar no cio, o período que os deixa extremamente vulneráveis ao Alfa. Meu irmão passa por isso a algum tempo, e toda vez usa algumas ervas para controlar seus extintos durante o processo doloroso que vivencia, já que ele ainda não tem um Alfa ao seu lado. Vendo todo esse drama não acontecer comigo, passei a acreditar que descendia dos antigos humanos, ou dos seres mágicos, como os magos e bruxas, e acreditar nessa ideia sempre me deixou aliviada, até que o homem diante de mim, apareceu.
Nunca fui capaz de sentir cheiro, falar com o lobo interior, mas desde que Paolo apareceu tudo isso mudou. Eu não esperava que ele fosse tão audacioso, e sentir seus braços ao redor me deixou desestabilizada, e como soldado, sei que não poderia permitir isso, tento empurrá-lo, mas é em vão e simplesmente não consigo me soltar, e por ser um Alfa Lúpus sua força é maior que outros, algo que desconhecia por nunca enfrentar esse tipo de Alfa. Entretanto, meu corpo parece travar uma luta com minha mente, dizendo ser errado deixar que isso aconteça, mas ao mesmo tempo sinto uma satisfação em sentir a força dos seus braços em volta do meu corpo, e principalmente o movimento voraz de sua boca na minha.
Sua boca toma conta da minha, e acompanho cada investida de seus lábios que esmagam os meus, me deixando entregue a isso como se eu sempre esperasse sentir esse contato. Sinto-me leve, é estranho, normalmente toda essa proximidade me deixaria desconfortável, nossos lábios colados, uma mão em minha cintura, e outra segurando meu braço, não sei o que está acontecendo comigo, minhas pernas tremem, os pelos do meu braço estão arrepiados, e minha boca abre e fecha. De repente algo parece diferente, é como se algo me impedisse de respirar, minha pele está queimando exatamente nos lugares que ele me toca. Não me reconheço. Sei que perdi essa batalha para meu corpo que não responde as ordens do meu cérebro, não tenho mais forças para raciocinar e desvencilhar-me dele. Seu beijo é intenso, sua boca suga meu lábio inferior com muita força, a urgência desse beijo está fazendo perder a razão.
Ele solta meus braços, e sinto uma de suas mãos na minha nuca, acariciando e me deixando torpe, ele afasta um pouco seus lábios e inicia uma trilha de beijos pelo meu pescoço, e um gemido que estava preso na minha garganta se faz presente naquele lugar, meu corpo parece estremecer a este contato. Sinto que estou um pouco fora de mim, que devia resistir, mas meu corpo foi tomado por um desejo incontrolável, e eu não tenho muitas opções neste momento. Minha mão acaricia seus cabelos, e puxo seu rosto com muita intensidade, nos olhares se encontram, e seus olhos estão azuis, e segundo ele, essa é cor do desejo. Seguro seu rosto e tomou seus lábios, e retribuindo o beijo, sinto sua mão segurar minha cintura, seu lábio torna a esmagar o meu, e uma sensação de prazer invade meu corpo ao sentir o gosto de sua, um misto de desejo e perigo, desperta uma sensação que jamais senti. Estamos tão entregues às sensações causadas pelo beijo que somos surpreendidos por uma voz, que me tira do transe em que me encontrava.
- ALLYSSA! O que é isso? - Balck diz em um tom desesperado.
Assim que escuto, me afasto do prisioneiro rapidamente, pego sua mão que estava solta, prendo novamente com a algema, levanto rapidamente e sigo em direção a porta, quero sair o mais rápido possível da cabana, mas meu irmão me detém.
- O que está acontecendo? Por que você está agindo assim?
Olho e faço sinal com a cabeça para sairmos, abro a porta e Balck vem atrás de mim, peço que um dos soldados vigie Paolo. Continuo andando e meu irmão atrás de mim.
- Allyssa, dá para você parar e conversar comigo?
- Balck, se você for me dar uma bronca pelo que você presenciou, é melhor nem começar! Sei que errei, não devia ter permitido que ele me beijasse, eu tentei, mas...
- Mas, o quê? O que está acontecendo com você? Foi por causa dele que você estava tão nervosa esta tarde?
- Não está acontecendo nada, Balck! Eu só fui fraca e não vou deixar aquele nobre idiota, encostar em mim novamente! - falo com muita raiva.
- Não minta pra mim, é claro que está acontecendo alguma coisa, estou sentindo o seu cheiro, e...
- E nada, não está acontecendo nada! - digo e continuo andando, passo por várias pessoas que me cumprimentam, e sigo em direção a nossa casa, e Black continua me seguindo.
Toda essa situação me faz sentir impotente por permitir que algo assim acontecesse, e o olhar de meu irmão me deixa desconfortável, por me sentir como uma garota frágil e vulnerável. Sento na cama, ele faz o mesmo, me abraça de lado, e encosta sua cabeça na minha.
- Seja lá o que estava acontecendo com você, sabe que eu sempre estarei ao seu lado, não sabe? - diz, e balanço a cabeça em concordância.
- Eu só queria viver em uma realidade diferente dessa que vivemos!
- Não começa com isso, Allyssa! Desde que os antigos humanos destruíram sua própria linhagem, e novas criaturas foram se desenvolvendo, o mundo é assim, e a gente não tem muito o que fazer diante disso...
- Temos sim, nosso mundo ainda está em reconstrução, e se a resistência tomar o trono do Rei, e o nosso líder assumir o poder, talvez ele possa...
- Allyssa, você não entende mesmo, não é?
- O que eu não entendo, Balck?
- Duric age de forma diferente com você desde que o mago Killian disse que independente de você ser Alfa, Ômega ou Beta, há algo de especial em você, e o líder sempre ouve o mago!
- Tudo bem, mas o que há de especial em mim?
- Quer dizer que você acha normal alguém chegar aos vinte anos e não entrar no cio, emanar num cheiro e ter as habilidades e força que você tem?
- Lá vem você com isso!
- Isso mesmo! E não adiante negar, fingir que isso que não há algo de especial com você, porque te conheço muito bem, e sei que você é diferente de Alfas, Ômegas e Betas. Tem outra coisa, mesmo que você não queira falar, não adianta negar, mas desde que o prisioneiro chegou aqui, eu venho sentindo um cheiro que emana de você, vive distraída e nervosa, além do acabei de presenciar...
- Eu nunca senti cheiro de ninguém, ou tive sentimentos estranhos vagando pela minha mente e corpo, e eu sempre fui feliz por achar que eu era diferente, e não teria que ceder a um maldito Alfa! - exclamo, e o encaro, as lágrimas insistem em escorrer. - Eu vi o quanto você sofreu quando descobriu que era um Ômega, e quando aquele maldito Alfa te iludiu, e você achou que eram predestinados, e eu não quero passar por algo assim, irmão!
As lágrimas escorrem ainda mais, Balck me abraça forte. Pensar em tudo que aconteceu me deixa irritada, frustrada, além de envergonhada por me deixar levar pelos instintos e permitir que aquele homem me beijasse. Aquilo poderia ser evitado, se eu não tivesse num momento de fraqueza, me deixado levar, por não resistir, e se ele estivesse armando para fugir? Sinto raiva de mim por isso, essa confusão de sentimentos vai me enlouquecer.
[...]
Caminho rapidamente, sigo em direção a cabana depois de ter descansado minha mente sobre tudo, infelizmente eu precisava voltar, mas não queria encarar o Alfa maldito, mas tenho que retornar e acertar as contas com aquele infame. Ao chegar dentro na cabana, agradeço ao soldado e o despenco, olho para Paolo, mesmo com a fraca luz que se propaga através da tocha, consigo ver seu sorriso de satisfação a me ver, ele me encara com satisfação, e reprimo a minha vontade de agredi-lo até que esse sorriso saia de seu rosto, mas ele solta uma leve gargalhada que ecoa pelo ambiente. Aproximo dele com muita raiva, me agacho e o puxo pela camisa.
- Eu acho melhor você tirar esse sorrisinho de satisfação do seu rosto, se não eu...
- Você vai fazer o quê, Allyssa? Ah, dessa vez é você quem vai tomar a iniciativa e vai me beijar? - olho com mais raiva, largo a camisa dele e solto uma tapa em seu rosto.
- Me bate mais, eu adoro mulheres que me batem! Bata com vontade, mas isso infelizmente não esconde o seu desejo por mim!
- Eu desejando você? É uma piada? Você me pegou de surpresa, acha mesmo que eu consentiria?
- Realmente te peguei desprevenida, mas você teve a oportunidade de me afastar, e gostou tanto que colocou suas mãos entre os meus cabelos e me beijou com mais vontade!
- CALA A BOCA!
- Tudo bem, mas você sabe que aquele beijo é só o começo...
- É só o começo de quê?
- Não se faça de desentendida, o seu cheiro demonstra que você me quer, e você também deve estar sentindo o meu, além de despertar o meu lobo antes do cio, e...
- Nunca ouvi tanta bobagem!
- Bobagem? Aquele guarda, o Yan estava conversando com o outro e dizendo que desde sua chegada ao território, ninguém tinha sentido o seu cheiro, e todos achavam que você descendia das bruxas, e já faz alguns dias que todos sentem o seu cheiro, e eu acho que você sabe o que isso quer dizer, não é?
- Não, eu não sei, e não quero saber mais nada!
- Jura que não sabe? Só há um tipo de lobo que demora tanto tempo a emanar seu cheiro...
- Qual?
- O Ômega lunar!
- O quê?
- É isso mesmo, e o mais importante é que o único tipo de companheiro que ele pode ter ao seu lado, é um Alfa Lúpus!