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ERA UMA VEZ... EM CASA BRANCA...
PARTE III
A notícia de sua possível futura paternidade, deixa Wagner no ar o tempo inteiro. Ele se admira do comportamento de Mônica que age com uma naturalidade irritante. À mesa, a moça ri e fala com todos com a simplicidade de sempre e isso o deixa muito aborrecido. Como pode alguém passar pelo que ela está passando e agir daquela forma. É preciso ter muito sangue frio. A impressão que dava é que ela fazia questão de brincar com sua aflição.
O clima de animação na família é grande. Os únicos que percebem alguma coisa são Cláudio e Tânia. Embora por razões diversas, os dois estão constantemente observando o rapaz. Fora isso, o almoço segue normalmente.
Jairo, Jorge e vários amigos de Leonardo lançam brindes e desejos de muitos anos de vida, boa saúde e sucesso ao velho fazendeiro, e ele se sente realizado e feliz demais para perceber que há algo de errado se passando pela cabeça do filho caçula, já que seu mais velho está para lhe dar um neto. Leonardo Valle não poderia querer mais nada naquele momento.
Seus presentes estão reunidos todos na biblioteca e aqueles pacotes coloridos atraem a atenção de suas duas filhas menores que escapam da mesa e correm até lá para bisbilhotar as coisas bonitas que o pai ganhou.
Mas o assunto em pauta continua sendo o futuro neto e a indicação de Cláudio como diretor do orfanato de Bárbara. Muito orgulhoso do filho que, mesmo não admitindo, sempre foi seu predileto, Leonardo ouve com um leve sorriso os elogios vindos de todos.
Por sua parte, Jorge também tem seu quinhão de orgulho, pois também vai ser avô e é sogro do jovem médico. Não se cansa de repetir que a filha está casada com o melhor partido de Casa Branca.
- Agora só falta vermos Mônica e Wagner casados com as suas respectivas caras-metades, ele diz.
Wagner fica vermelho e não sabe para onde olha e onde coloca as mãos. Mônica abaixa os olhos e sorri discretamente.
- É cedo pra se pensar nisso, diz Jairo, pegando a mão da filha.
- Também acho, concorda Wagner, levantando-se. - Se me dão licença...
Ele sai da mesa e da sala.
- Que deu nele? - pergunta Jorge.
- Quando um rapaz fala que ainda é cedo pra casar, é porque já está pensando nisso, diz Tânia, de um modo malicioso que só Cláudio e Mônica percebem.
Os demais riem. Cláudio pede licença a todos e levanta-se também, saindo atrás do irmão, mas já não o encontra. Lopes, escovando o cavalo fora da casa, o informa que ele saiu.
- Você viu pra onde? - Cláudio quer saber.
- Aquela turma dele estava toda aqui em volta dos carros, nas motos deles e até a caminhonete do supermercado do Lage estava aqui. Chegaram aqui há pouquinho. Vieram atrás dele. Ele se uniu a eles e saíram em direção à cidade.
- Não era pra ele ter ido, Cláudio diz, aborrecido, olhando na direção da estrada. – Hoje é um dia especial pro papai.
- Foi o que eu disse pra ele. Sabe o que ele respondeu?
- "Meta-se com a sua vida, Lopes".
- Exatamente. Eu achei melhor não me meter, Lopes diz, dando de ombros, continuando a escovar Apache.
- Não tem problema. Se ele tem algum tipo de consideração por meu pai, ele volta daqui a pouco. Tem que voltar...
Mônica aproxima-se deles. Ao ver a moça se aproximar, Lopes pede licença e vai com o cavalo para o estábulo. Ela pergunta:
- E o Wagner?
- Saiu, Cláudio responde. – Com a turma dele.
- Eles saíram? - ela pergunta, parecendo aborrecida. – Poxa, eu queria ter ido com eles...
Cláudio olha para ela, estranhando estar ouvindo aquilo de sua boca.
- Você nunca foi ligada a eles.
- A nossa festa de aniversário foi muito maneira. Eles são muito divertidos. Você devia estar lá, ela diz sorrindo.
- O tipo de diversão da turma do Wagner não faz muito meu gênero. E eu pensei que também não fosse o seu.
- Falta de costume... Seu e meu. Você se casou cedo demais. Desperdiçou sua vida. Não vale a pena. A vida tem que ser vivida ao máximo, em todos os sentidos. É o que eu quero começar a fazer.
- Como naquela noite?
- Que noite? - ela pergunta, séria.
Cláudio demora a responder.
- Do seu aniversário...
Ela também faz uma pequena pausa e finalmente responde:
- É... por exemplo.
- Eu posso concordar em tudo com você, mas existe sempre um porém.
- Qual?
Ele a olha de frente e responde:
- Nem todo mundo sabe aproveitar a vida como se deve. Muitas vezes acaba estragando tudo... e o estrago é irreversível.
- Isso parece uma direta pra mim, doutor? - ela pergunta, também olhando Cláudio nos olhos.
- Pode ser, ele diz, muito sério.
Ela sorri.
- O Wagner te contou?
- Muito por alto.
- Eu não quero que meu pai saiba, pelo menos não por enquanto. Eu inda não tenho certeza de nada. Colabora com a gente, tá?
- Eu não trairia meu irmão. Principalmente sabendo que ele não teve culpa. Foi um idiota, ingênuo, mas não teve culpa. Eu sei que não teve.
Ela dá uma risada discreta e se senta no primeiro degrau da escada da varanda.
- Qual é a graça? - ele pergunta.
- Eu estou me sentindo a verdadeira sedutora do rapazinho de vinte anos. Isso é muito bom.
- Por quê?
- Porque geralmente é a mulher que fica por baixo nesses casos. Ela é sempre a coitadinha, a vítima e eu não me encaixo mesmo nesse perfil. Não estou nem um pouco arrependida do que fiz. Eu nunca me arrependo do que faço.
- Mesmo sabendo que vai fazer sofrer pessoas que te amam.
- As pessoas que me amam vão saber me entender e cuidar de mim... se realmente me amam.
- Mesmo assim. A última coisa que seu pai quer é que você seja mãe solteira.
- Eu não disse que estou grávida. Ainda não disse... nem pro Wagner. Se ele deduziu isso não fui eu quem confirmou nada. A festinha não tem nem uma semana... E meu pai vai entender se acontecer. Ele é médico e me ama.
- Você vai acabar com a vida do meu irmão.
- Já disse a ele que não vou envolvê-lo nisso. Mesmo que eu esteja grávida, meu pai não vai saber quem é o pai.
- É surpreendente. Nunca imaginei que uma coisa dessas passasse pela sua cabeça. Você sempre me pareceu muito... equilibrada, para uma garota de dezesseis anos.
- Dezessete... - ela corrige.
- Claro, dezessete... Eu sempre apostei em você e sempre achei que seria uma excelente enfermeira. Sempre foi boa filha e tudo o mais. Agora... está parecendo uma menininha sem juízo, jogando a vida pela janela. Como essas que o Wagner namora uma semana e descarta na seguinte.
- E você por certo escolhe a primeira.
- É evidente.
- Pois bem, doutor. Eu vou tentar me comportar como uma garota equilibrada de hoje em diante.
- Não estou te cobrando nada. Você age como acha que deve agir.
- Tem razão, afinal de contas, talvez agora eu já não possa pensar só em mim, ela diz, colocando a mão na barriga. - Aliás... eu ainda não o parabenizei pelo bebê. Você e minha prima devem estar muito felizes. É bom saber que a família vai aumentar.
Ele se cala. Mônica sorri e afasta-se dele, entrando na casa. Cláudio encosta-se no pilar que sustenta a varanda e fecha os olhos, respirando fundo.
Tânia passa por Mônica na porta da casa e ao aproximar-se dele percebe sua preocupação.
- Está tudo bem, amor?
Cláudio se surpreende e automaticamente responde:
- Está... tudo bem.
- Passei pela minha prima. Ela te aborreceu?
- Não... Estávamos só falando do... Wagner. Ele saiu com a turminha dele e hoje não é um dia pra ficar longe daqui por bobagem. Meu pai já se aborreceu com ele, semana passada, e... tomara que ele volte antes do meu pai perceber que ele saiu.
- Teu irmão precisa levar um susto pra tomar jeito.
- Acho que ele já está bem assustado, Cláudio fala quase para si mesmo.
- O quê? - ela pergunta, pois não ouviu bem.
- Nada... Vamos entrar?
- Com certeza! - ela diz animada, passando o braço em volta da cintura dele. – O homenageado do dia não pode ficar aqui fora.
- O homenageado do dia é meu pai, Tânia.
- Também! E nós três com ele! - ela diz, tocando a barriga e abraçando-se a ele.
Ele sorri sem vontade e aceita seu abraço.
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Wagner e os amigos saem juntos de Quatro Estrelas e vão a Casa Branca, parando no bar e restaurante da praça da matriz no centro da cidade. Diante da praça, há a igreja dedicada a Nossa Senhora das Dores, imponente e majestosa.
Os carros e motos param por ali e eles entram barulhentos, sentando-se às mesas, já pedindo cervejas e sanduíches, mas o humor de Wagner estava longe das expectativas do grupo. A animação dos demais não o estava contagiando. Desde que saiu da fazenda ele não abriu a boca. Simplesmente entrou na caminhonete de Beto, seu melhor amigo, e foi até a cidade, distante e pensativo.
Beto o conhece a tempo suficiente para saber que alguma coisa estava acontecendo. Sentando diante dele na mesma mesa, apoia os braços nela e diz:
- Ei, cara, que bicho te mordeu?
- Não estou legal, hoje... – ele diz, olhando para o copo diante dele, com a cabeça apoiada na mão.
- Não está legal por quê? Papai cortou a mesada? - Leo pergunta gozador.
- Vai ver ele deu, mas a mesa era muito grande, Guto acrescenta, rindo em seguida, acompanhado pelos outros, menos pelo próprio Wagner, que não acha a menor graça e olha para todos de um jeito que faz todo mundo parar de rir.
- Se estão a fim de me gozar é melhor me levar de volta pra fazenda. Se eu estou assim é por culpa de vocês mesmo.
- Que foi que a gente fez? - Guto pergunta.
- Eu nem pedi teu carro emprestado essa semana! - Leo observa.
- Abre logo o jogo, Wagner, insiste Beto. – Que foi que aconteceu?
- Eu não posso falar ainda... mas podem estar certos de que se eu me encrencar... todo mundo vai entrar no rolo comigo. Pelo menos todo mundo que estava no clube Orleans e depois foi pra tua casa no sábado passado.
- Pensei que teu pai não soubesse de nada, diz Beto.
- Não, ele ainda não sabe de nada, nem eu quero que saiba. Aconteceu outra coisa...
- Coisa melhor ou pior?
- Pior...
- Tem barriga no meio, no mínimo, Laura diz. – Acertei?
- Isso mesmo... e uma barriga que eu daria todos os meus vinte anos pra que não existisse.
- Mamãezinha! - fala Beto, escorregando na cadeira, passando a mão pelo rosto.
- Mas as garotas que foram com a gente naquele dia estão aqui, diz Leo. – Dina, Laura, Sandra...
- E nenhuma de nós está, tenho certeza, fala Dina, categórica.
Beto apoia os braços na mesa e fala em voz baixa:
- Está esquecendo o motivo da festa? Do que a gente foi fazer na minha casa?
- Comemorar o aniversário do Wagner e da... - começa Guto.
- Falem baixo! - exclama Wagner. – Ou nem falem. Isso é pavio de bomba! Se isso se espalha, Casa Branca vai virar de cabeça pra baixo e eu com ela!
- Papagaio! Que rolo! - exclama Dina.
- Ela confirmou? - pergunta Sandra. – Tem tão pouco tempo...
- Confirmou por A mais B que o rolo... foi comigo... - diz ele, olhando para Janete, esperando reação e ela vem.
- Cachorro! - ela diz, batendo nele.
- Calma, Janete! Eu estava de porre, caramba! Não me lembro de nada! Qualquer homem faz bobagem numa situação dessas... E ela ainda teve a piedade de me tranquilizar prometendo que não vai me envolver.
- Ela prometeu isso? - Sandra pergunta. – A troco de quê?
- Não tenho ideia, mas isso no início me deixou mais tranquilo.
- Ah, então está tudo bem, fala Guto.
- Está tudo bem agora, enquanto ninguém sabe de nada, diz Wagner. – Quando aquela barriga começar a dar o ar da graça, se ela realmente existir, todo mundo vai querer saber de quem é, e tem gente demais sabendo que eu e ela estivemos fora de casa na mesma noite. Naquela festinha os únicos sem nenhum envolvimento com ninguém éramos os dois. O Beto namora e estava com a Sandra, o Guto com a Dina, o Leo com a Laura e a Jane, que podia me tirar da lista de suspeitos, não foi porque morre de ciúme da Mônica e fez birra no dia...
- Devia ter ido... - Janete fala, emburrada.
- E quem mais sabe? - Beto pergunta. – Seu irmão? Eu te deixei na casa dele, a seu pedido, quando levei a Mônica pra casa porque você não queria e nem dava pra eu te levar até a fazenda. Eu estava muito zoado, ele diz, rindo. - No mínimo ia acontecer alguma coisa no caminho bem pior que uma gravidez...
- Mas o teu irmão é gente fina. A gente sabe que ninguém sabe de nada porque ele aliviou tua barra. Ele não vai te dedar.
- Ele não, mas a mulher dele não me suporta, vocês sabem. E ela fez o favor de contar pra mãe e pro pai dela, aí o tio Jairo ficou sabendo...
- O pai da Mônica também sabe?
- Sabe, mas, por eu justamente ser irmão do Cláudio, ele aliviou a minha. Só que não tem nem ideia de que... do que eu fiz...
- Não é melhor abrir o jogo de uma vez? - Leo pergunta.
Todos começam a rechaçá-lo.
- Eh, ficou maluco, cara?!
- Belo amigo você! - repreende Beto, batendo de leve na cabeça do rapaz.
- Eu tenho certeza de que não fiz nada com ela, defende-se Guto. – Eu e a Dina saímos de lá antes das onze.
- O Wagner já disse que o rolo é dele, Guto! - Leo diz. – Está na cara que não foi nenhum de nós. O problema estará no fato de ela não dizer exatamente de quem é. Filho sem pai... não existe. Aí chegamos ao ponto zero: a culpa recai em cima de todo mundo. Então, cabe a você dizer, Wagner.
- Você pirou mesmo, cara! Você acha que, se nem ela quer que eu me meta, eu vou fazer a besteira de me entregar? Que idiota você acha que eu sou?
- Você aprontou, assuma! - diz Janete, com raiva.
- Eu não aprontei nada!
Todos olham para ele pensando justamente o contrário.
- Tá! Eu aprontei... mas eu estava bêbado, não tinha consciência do que estava fazendo. Vocês acham que eu faria um troço tão idiota como esse com a filha de um amigo do meu pai e patrão do meu irmão? O pai dela é um dos médicos mais respeitados de Casa Branca, poxa! Eu não faria isso... Ela é mais culpada que eu! Estava consciente e tudo! Eu não vou me prejudicar por causa de qualquer menininha biruta, mesmo sendo a filha de Jairo Telles.
- Eu estou contigo, apoia Beto.
- Eu também, junta Guto. – Se a gente estava junto vamos continuar juntos... mesmo que tenhamos que provar que nós quatro somos o pai.
Todos riem mesmo Wagner que sempre se diverte com o humor inocente e ingênuo de Guto.
- A gente está rindo, mas a coisa é séria, pessoal, diz Sandra.
- Também acho, concorda Janete. -Vocês não estão na pele dela.
- Não defende não, Jane. Se ela não quisesse, não teria procurado, diz Leo.
- A ideia de levá-la à festa foi do Wagner, ela continua. - Foi ele quem quis que ela fosse.
- Janete, ela é uma adolescente que vive fechada naquela casa com o pai, defende-se Wagner. - Acho que ela nem teve infância. Viveu a vida inteira acompanhando ele praquele hospital. Eu achei que era uma forma de ela se divertir um pouco, espairecer. Ela mesma me disse que adorou ficar com a gente lá.
- Mas a culpa foi sua! - ela continua irredutível, mais por ciúme dele que por querer defender Mônica. – Foi se meter na solidão dos outros e olha aí no que deu.
Por pura provocação, Wagner encosta-se à cadeira e fala orgulhoso:
- Não tenho culpa se ela escolheu a mim. Ela mesma me disse que não resistiu.
- Você está é morrendo de ciúme e inveja, Janete, diz Guto.
- Não te mete, Guto, ela diz, empurrando o rapaz.
- Vamos parar com essa discussão, gente, Wagner diz, tentando colocar panos quentes na discussão. – Eu não contei pra vocês pra gente brigar. Eu preciso de vocês. São meus amigos e quero vocês comigo. Os fatos são estes. Todo mundo já está preparado pro golpe. Agora, cada um age como achar melhor. Se quiserem se defender dizendo a verdade, não vou impedir ninguém.
Wagner olha para Leo e Janete. Todos fazem o mesmo. Leo declara:
- Não se preocupe, eu não sou dedo duro. Estou com todo mundo... e principalmente com você.
Ele levanta mão e Wagner bate nela.
- Valeu, cara.
Beto enche o copo de Leo e bate em seu ombro.
- Bom menino!
Janete se levanta e sai da lanchonete, emburrada.
- Será que ela vai dar contra? - Guto pergunta.
- Pode deixar, diz Sandra. - Eu vou conversar com ela.
Beto segura a mão dela e sorri.
- Obrigado, Sandroca, agradece Wagner.
Na fazenda, depois do anoitecer, todos os convidados já foram embora e Leonardo nota a falta de Wagner. Procura por ele por toda a casa e não o encontrando, sobe até seu quarto, onde Cláudio vai começar a examinar Elis, a filha caçula, que teve um começo de resfriado. Magda e Diana estão com ele.
- Você sabe do seu irmão, Cláudio?
- Saiu, ele diz, tirando o estetoscópio da valise.
- Isso eu sei, mas ele foi pra onde?
- O Lopes o viu sair com os amigos. Acho que foram pra cidade.
- Mas até hoje? Às vezes eu acho que Wagner não me estima como pai, ele fala, sentando-se ao lado de Magda na cama.
Cláudio ri, enquanto coloca o aparelho nos ouvidos, depois o encosta nas costas da irmã.
- Você ri agora porque seu filho ainda nem nasceu, mas vai sentir na pele mais tarde.
- Psiu! – Cláudio faz, coloca o dedo em riste na boca, pedindo silêncio.
Leonardo se cala e acaricia os cachinhos muito pretos da menina. Ela sorri e segura a mão do pai. Cláudio termina o exame e conclui:
- Está bem melhor. Só mais uns três dias e vai estar novinha em folha. Só não sair no vento e no sol forte, certo, garota? - ele pergunta, segurando o queixo da irmã e beijando sua bochecha.
- Certo! - ela confirma, pulando em seu pescoço e colocando o estetoscópio nos próprios ouvidos.
Cláudio se ergue com a irmã no colo.
- Vou providenciar um café pra você, quer? - Magda pergunta, levantando-se.
- Não, obrigado, Magda. Café me tira o sono e eu preciso dormir esta noite. Meu plantão no hospital é amanhã.
- Então desça pra comer mais um pedaço de bolo do seu pai. Vou preparar um pedaço pra você e a Tânia levarem pra casa.
- Por favor... - ele diz sorrindo. – Estava uma delícia, obrigado. Mas o que é mesmo que você estava dizendo, pai?
- Estava falando a ingratidão do seu irmão que sai com os amigos até num dia como hoje.
- Ele deve estar voltando já. Você sabe que ele nunca gostou de festa.
- Festa familiar, você quer dizer, porque de festinhas com essa molecada ele não deixa de participar.
- Não e eu concordo com ele, Cláudio diz, com um meio sorriso.
- O quê?! - Leonardo se admira.
- Ele é jovem, pai. Jovem, solteiro e rico. Tem mais que aproveitar.
- Como você não aproveitou. Está jogando na minha cara?
- Não, claro que não, fique tranquilo. Não senti falta de nada disso, mas no caso dele, é isso mesmo que ele tem que fazer.
- Tenho certeza de que você não faria o que ele faz, mesmo que fosse solteiro.
- Tem mesmo? - Cláudio pergunta, olhando para a irmã, evitando olhar para o pai.
- Tenho, Leonardo confirma categórico.
- Tem pai que é cego - o rapaz diz, afastando-se com ar divertido.
Leonardo fica sério a princípio, mas depois sorri também, tomando aquilo como brincadeira. Cláudio retira o estetoscópio das mãos de Elis que reclama.
- Deixa eu ouvir seu coração, Cla...
- Isso não é brincadeira, cheirosa. Vamos lá embaixo comer mais bolo do papai?
- Vamos!
Ele coloca o aparelho na valise, desce e vai para a cozinha, onde Magda está com Bárbara e Tânia, separando algumas roupas que serão levadas ao orfanato para serem doadas às crianças.
- Eu pensei que cozinha fosse lugar de comida e não de roupa usada, ele diz ao entrar.
- O motivo dessa bagunça é muito justo, por isso cabe em qualquer lugar, diz Bárbara. - Estávamos justamente falando de você, querido.
- E em que eu lembro roupa usada? - ele brinca, colocando Elis sobre uma cadeira.
- Nada a ver, só estávamos comentando a sua futura direção do orfanato.
- Ah, me sinto bem melhor agora. Vim te entregar sua boneca, mãe.
- Obrigada, filho, Magda responde, pegando a menina no colo. – Já entreguei o bolo pra Tânia.
- Quero outro pedaço, diz Elis.
- Vem aqui que eu te dou, diz Matilde, segurando a menina no colo e tirando-a dali.
- Eu acho tão esquisito ouvir você chamar a Magda de mãe, diz Bárbara. – Chega até a ser uma ofensa. Ela tem, no máximo, idade pra ser sua irmã mais velha.
- E mesmo assim só oito anos, concorda Tânia.
- Eu adoro isso, diz Magda. - Mas não é sempre que ele me chama assim.
- Ela é a única mãe que eu conheci de verdade e que me deu duas irmãs, diz Cláudio aproximando-se de Magda, passando o braço em volta do ombro dela. – Quando eu falo com ela pensando nisso e estou perto das meninas, chamo de mãe. Quando eu olho pra ela e penso na mulher bonita com quem meu pai se casou, chamo de Magda. São a mesma e eu amo as duas.
Magda lhe beija o rosto, emocionada.
- Se você chorar, eu vou te chamar de vovó, ele brinca.
- Até eu fiquei emocionada, diz Bárbara.
- E como eu não gosto de choradeira de mulher, vou me retirando, diz ele, pegando a mulher pela mão. – Tchau, gente. Boa noite.
Cláudio beija as pontas dos dedos da mão e vai colocar na bochecha de Elis, beija Magda no rosto e abraça o pai.
- Parabéns de novo. Te amo. Cadê a Diana?
- Na biblioteca organizando os presentes do pai dela. Tirando das caixas, guardando alguns... fazendo o que ela estava doida pra fazer a tarde inteira.
- Dá um beijo nela por mim. Tchau.
- Tchau, filho, diz Leonardo. - Obrigado por tudo.
O casal sai da cozinha. Quando chegam à sala, Tânia diz:
- Você é outra pessoa quando está aqui...
Ele para e olha para ela, estranhando a observação.
- Como assim... outra pessoa?
- Carinhoso, afetivo...
- Não sei do que você está falando, Tânia. É minha família.
- E eu não sou?
- O que você acha? Não começa a discutir. Estava tudo bem até agora. Tivemos um dia tranquilo, sem problemas... O que está faltando?
Ela o beija e encosta o rosto em seu peito.
- Desculpa, eu estou um pouco cansada. Deve ser emoção de grávida.
Ele sorri e a beija de novo.
- Você ainda me ama? - ela pergunta.
- Ainda? – ele pergunta, entranhando a palavra. - Amo... claro que amo. Eu tenho que amar a mãe do meu filho e vou continuar amando... até o momento em que você me fizer esquecer disso com perguntas bobas feito essa.
Ela sorri e o beija novamente, apaixonada. Wagner entra nesse momento e, ao ver os dois, fica observando o casal com um leve ar de ironia, depois começa a bater palmas bem lentamente. Os dois se afastam e olham para ele.
- Cenário igual, eu só vi no cinema. Lindo! Muito bonito mesmo!
- Onde você estava? - Cláudio pergunta.
- Por aí... mas "vortei, num vortei, cumpadi"?
- Papai perguntou por você. Está todo mundo lá na cozinha. Vá avisar que já voltou e trate de ficar o resto da noite com ele. Afinal, que tipo de filho você é?
- Você não quer mesmo que eu responda, quer? - pergunta o rapaz, cinicamente.
Cláudio contém o riso e pergunta:
- Bebeu de novo?
- Não, Wagner responde secamente. – Só água e refrigerante. Isso pode, não pode... papai?
Cláudio percebe que ele está realmente muito nervoso e resolve ir com calma.
- Vá logo falar com todo mundo. A gente já está indo.
Wagner se aproxima do casal e provoca novamente:
- Vocês formam um lindo casal, já disse isso?
- Já, Cláudio responde, para encerrar o assunto.
- Já? Poxa... não costumo dizer a mesma mentira duas vezes. Preciso renovar o meu baú.
- Sai daqui, Wagner, fala Cláudio, sustentando seu olhar.
O rapaz passa pelos dois rindo e vai para a cozinha.
- Sem graça... - Tânia fala, baixinho.
- Se é uma coisa que ele não está querendo fazer agora é graça. Ele está bem nervoso. Eu prefiro vê-lo fazendo piada, do que desse jeito. E se não fosse ele e minhas irmãs, essa casa seria um túmulo.
- Seria divertido, se ele não fosse tão inconsequente e bobo.
Cláudio resolve não insistir mais.
- Boba é você, ele diz, dando outro beijo nela. Depois sai da casa puxando-a pela mão.
Em uma semana, Cláudio toma posse do cargo de diretor do orfanato do Desterro, que também assiste mães pobres que precisam de auxílio na hora de ter seus filhos.
Cláudio passa a ter uma vida um pouco mais corrida. Trabalha durante a manhã como médico pediatra na Santa Casa de Casa Branca, às tardes de terça e quinta no orfanato e dá plantões durante a madrugada no ambulatório do Hospital Santa Mônica, de Jairo.
Numa sexta-feira, início de dezembro, ele está em seu consultório atendendo uma mãe que veio consultar o filho de sete anos, quando o interfone que se comunica com sua sala, toca:
- Doutor Cláudio! - diz a voz da atendente.
- Oi, Regina.
- Seu irmão está aqui e insiste em falar com o senhor.
Aborrecido, Cláudio balança a cabeça.
- Eu sei que você já disse que eu estou trabalhando, mas...
- Já, doutor, mas ele está pedindo só um... tempinho, palavras dele.
Cláudio respira fundo e retorna:
- Dois minutos, já termino. Segura ele aí, por favor, Regina.
Ele desliga o aparelho e retoma sua consulta, que realmente estava já no fim. Dispensa a mãe e vai levá-la até a porta, despede-se e já vê Wagner perto dele. O faz entrar no consultório e fecha a porta atrás de si, aborrecido.
- Wagner, eu não tenho tempo...
- Eu passei, cara! - ele diz em voz alta, segurando o irmão pelos ombros.
Sem entender nada, o médico repreende:
- Fala mais baixo! Isso é um hospital. Passou no quê?
- Passei no vestibular pra Engenharia! - ele continua sem se importar com a preocupação do irmão.
- Não me diga! - Cláudio diz, feliz pelo irmão.
- Não me diga "não me diga"! Não vai me dar os parabéns?!
Wagner abre os braços e Cláudio o abraça.
- Bem, espero que seja o início de uma vida nova pra você. Menos diversão, mais responsabilidade... menos saídas com a... turminha...
- Todo mundo passou também! O Leo, o Beto, a Sandra, o Guto, a Dina... Todos! Só não a Janete porque não prestou. A gente vai junto pra Campinas! Não é o máximo!?
- Retiro o que eu disse, lamenta Cláudio, indo se sentar em sua mesa, desanimado. – Eu chego a pensar que nem valeu a pena você ter conseguido.
- Não diz besteira, cara. Você está me subestimando. A gente vai entrar firme nessa. Eu vou ser Engenheiro Agrônomo nem que vaca dê guaraná em vez de leite!
- Que os anjos digam amém! Papai já sabe?
- Não. A gente está vindo da faculdade agora. Passei aqui porque eu queria que você fosse o primeiro a saber.
- Por que eu? Quem te banca e sustenta é ele.
Wagner se senta diante dele.
- É que eu me lembro que... quando você passou no vestibular de Medicina, contou primeiro pra mim e... eu nem sabia o que era isso. Eu tinha só onze anos.
- Wagner... e ... a Mônica?
A expressão de Wagner se modifica totalmente.
- Me diz você. Você trabalha com ela todo dia. Ela te disse alguma coisa? Eu nunca mais a vi.
- Não, nada. Ela se fechou em copas nesse sentido. Só conversamos sobre trabalho. E ela tem vindo pouco à Santa Casa e quando vem conversa mais com o Miguel e com as enfermeiras do que comigo.
- Faz sentido. O Miguel é ginecologista, não é? Se ela está mesmo grávida, deve estar se consultando com ele. Ele não te conta nada? Vocês são amigos...
- A gente não pode conversar sobre o paciente do outro, a menos que ele esteja correndo algum perigo de morte e disso dependa a vida dele. Só se for pra ajudar. E a minha área é totalmente diferente da dele. Ele é ginecologista/obstetra.
- Ah, é... mas você podia tentar colocar ela contra a parede. Afinal, você é meu irmão e o... ferrado da vez sou eu. Eu procuro nem pensar mais nisso, já que ela pediu pra não pensar, mas quando eu penso... sinto vontade de sumir do Brasil.
- É, mas... você precisa tirar isso a limpo antes de pensar em seguir com a faculdade.
- Você está falando como se fosse certo que eu vou ter que me meter nessa de casar e ter filho. Você acha que ela está mesmo grávida e que... possivelmente... que o filho é meu?
- Não sei, meu irmão. Eu só acho incrível que você não tenha nenhuma lembrança de nada sobre aquela noite.
- Eu não me vejo nem beijando a Mônica, Cláudio! Não está no meu histórico de vida romântica ter qualquer coisa com ela. Eu não sinto nada por ela, nunca senti, a não ser amizade de infância quando eu nem sabia beijar ainda. Ela pra mim é... uma boneca de porcelana que eu não teria direito nem de tocar. Eu morro de medo daquele pai dela. O Jairo é um senhor feudal que prende e guarda a filha num castelo de vidro.
- É mais ou menos por aí... - Cláudio diz com um leve sorriso quase para si mesmo. – Eu sempre vi assim também e sei que ela também se sente do mesmo modo.
- Sabe, como sabe? Ela já te falou alguma coisa?
Cláudio percebe que falou demais e desconversa.
- Não, nada, é só o que eu noto no dia a dia dos dois.
- Eu não sei mais o que eu faço, Cláudio. – Me dá uma luz!
- Eu adoraria te ajudar, mas...
Wagner se sente revoltado com o que está acontecendo e se levanta, começando a andar pela sala, nervoso, esfregando as mãos uma na outra.
- Eu não vou assumir essa, não. Eu tenho uma vida pra viver ainda. Eu não me caso com ela, nunca!
- E vai fazer o quê? Fugir de casa, se essa história se confirmar?
- É uma ótima ideia!
- Por favor, Wagner, eu falei brincando. Você mata o papai do coração. Eu acho que ele não vai gostar de saber que você cometeu um erro desse, mas vai gostar menos ainda se você fugir pra não assumir isso.
- E eu faço o quê? Greve de fome? Eu não vou me casar com ela. Eu tinha outros planos pra minha vida...
- Além da faculdade?
- É...
- E eu posso saber quais?
Wagner volta a se sentar.
- Se ela disse que ama outro cara... eu também tenho outra pessoa.
Cláudio olha para o irmão sem acreditar.
- Como? Você não tem nem namorada. E não me fale da Janete porque ela pensa que namora você, mas eu sei que você só se diverte com ela...
- Não, não é a Janete. Você não conhece, Ela nem mora em Casa Branca. Ela é de São Paulo.
- E como você fez pra conhecer uma garota de São Paulo? Você está inventando isso por causa da situação.
- Eu posso provar - o rapaz diz, tirando a carteira do bolso da calça.
Tira dela uma fotografia e mostra para o irmão que olha sem acreditar a foto dele ao lado de uma garota, tirada diante da Escola Estadual Dr. Francisco Thomaz de Carvalho no centro da cidade.
- O nome dela é Selma. A gente tirou essa foto há três anos quando ela esteve aqui com o pai. Ele tinha negócios com o papai. Também trabalha com beneficiamento de leite lá na capital. A gente ficou amigo, eu a levei pra visitar a cidade e... adorei ficar com ela, no tempo que ela esteve aqui. Nos correspondemos por algum tempo, aí... eu me formei no colégio, ela também... e gente parou de se falar, mas eu ainda tenho intenção de voltar a me comunicar com ela. Não consegui esquecer dela.
Cláudio olha para a foto por mais uns instantes e diz:
- Difícil imaginar, você apaixonado...? Que idade ela tem?
- A mesma idade que eu. E se a Mônica estiver mesmo grávida e resolver me envolver nisso, eu fujo pra São Paulo, caso com a Selma e ninguém mais me vê em Casa Branca.
- Você está se jogando num futuro que não sabe nem que vai acontecer, Wagner. Como você pode ter certeza de que essa moça vai querer casar com você, se faz três anos que vocês não se vêem.
- Se não quiser, eu fico por lá do mesmo jeito.
- E o papai? Você não pensa nele?
- Penso, mas penso mais em mim, casado com alguém que não tem absolutamente nada a ver comigo. Ainda se fosse a Janete... tudo bem, a gente fala a mesma língua, não seria difícil me adaptar a um casamento assim, mas com a Mônica? Ela é muito... "filhinha de papai" pro meu gosto. Vai ser enfermeira e tudo o mais... Eu não saberia nem como beijá-la! Aliás, eu nem me lembro de ter feito isso alguma vez na vida. Isso é muito estranho. E outra: ela é prima da sua mulher! Deve ter no mínimo o mesmo gênio. Seria pagar todos os meus pecados nesta vida mesmo. Imagine, eu casado com uma viborazinha daquelas. Nunca que eu vou cair numa armadilha dessas. Eu prefiro ser deserdado, juro.
- A Mônica é bem diferente da Tânia, - diz Cláudio. - Totalmente diferente. É muito difícil haver uma discussão entre nós e olha que eu trabalho com ela praticamente o dia inteiro.
- Então casa você com ela também. Eu estou fora.
- Que ideia idiota.
- Vocês é que dariam um casal perfeito, sabia? Pensam igual, trabalham com a mesma coisa...
- Para com isso. Se a Tânia te ouve falar assim, acabou-se a minha paz.
- Maravilha! Aí ela te dá o divórcio de vez. Não é uma boa?
- Chega, Wagner. Eu preciso trabalhar! Se você ainda não sabe se tem filho pra criar, eu tenho certeza que tenho. Vai contar a novidade pro papai. Ele vai ficar bem feliz.
- Cláudio, se você ainda tem alguma intimidade com a Mônica, tenta arrancar alguma coisa daquela maluca. Descobrir quem é esse cara misterioso que ela diz que ama e foi a causa dessa doideira que ela fez comigo... Por favor!
- Eu vou tentar, mas fica tranquilo, curte o seu momento e parabéns novamente. Estou orgulhoso.
Os dois se abraçam e antes que o abraço termine, Regina entra na sala bastante aflita:
- Desculpe, doutor Cláudio, mas... a Mônica está aí fora e parece não estar muito bem.
Os dois se olham por um momento e saem rapidamente. Na sala da recepção, Mônica está sentada numa cadeira rodeada pelas mães que aguardavam a consulta, muito pálida e aparentemente muito nervosa.
- O que foi? - Cláudio pergunta, abaixando-se diante dela.
- Eu não queria que a Regina fosse chamar você... Eu já estou bem. Foi só um mal estar.
- Você está branca feito cera, diz Wagner.
- Já disse que estou bem.
Regina aparece com um copo de água que entrega a ela. Mônica bebe pequenos goles, devolve o copo e se levanta.
- Entra no consultório. Eu vou aferir sua pressão - diz Cláudio.
- Não precisa, eu só...
- Não teima! - ele insiste. – Vem.
Ela entra com os dois no consultório e Cláudio afere sua pressão.
- Dez por seis. Está baixa mesmo, ele diz.
- Eu só vim avisar que... meu pai quer fazer uma reunião com os médicos do ambulatório hoje à noite. Todos, no Santa Mônica.
- Podia ter ligado, Cláudio diz.
- Eu estava indo pra casa. Ia passar por aqui e aproveitei... Acho que o sol está muito quente e eu ainda não almocei... Minha pressão deve ter caído.
- Eu podia de aplicar uma injeção pra...
- Não! - Mônica diz prontamente.
- Por que não? - ele estranha.
- Porque... eu já estou melhor. É só comer alguma coisa. Você me acompanha, Wagner? Aliás, o que... você está fazendo aqui? - ela pergunta ele.
- Eu... passei na Unicamp... Engenharia, ele diz. – Vim contar pro Cláudio.
Ela sorri.
- Parabéns!
- Obrigado, ele fala, pegando a mão dela e a ajudando a se levantar. - Vamos?
- Desculpe, não era minha intenção tirar você do seu caminho...
- Faço questão. Eu também ainda não almocei. E a gente precisa mesmo conversar.
Mônica se levanta e concorda, passando a mão pela testa. Olha para Cláudio como se quisesse dizer alguma coisa, mas sai da sala. Wagner a acompanha, despedindo-se do irmão com um aperto de mão.
- Tchau, a gente se fala.
- Tchau... - diz Cláudio que segura o braço do irmão e pede: - Vai com calma com ela, tá?
Wagner apenas meneia afirmativamente com a cabeça e sai.
No restaurante, enquanto esperam o prato pedido, Wagner pergunta:
- O que está acontecendo de verdade, Mônica? O que você tem?
- Nada... Está tudo bem, ela diz com um sorriso que não o convence. – Foi só uma queda de pressão mesmo. Você ouviu seu irmão dizer. Eu só estou com fome... e estou muito feliz por você. Se você se tornar um Engenheiro Agrônomo, vai poder ajudar muito seu pai na fazenda. É muito nobre isso.
Ela coloca a mão sobre a dele. Wagner não consegue sair do assunto.
- Não desconversa. Eu nunca mais consegui falar com você sobre... você sabe o quê. O Cláudio disse que nem ele te encontra mais. Que você só fala com seu pai, com o Dr. Miguel, com todo mundo no hospital menos com ele. Eu preciso saber: você está mesmo grávida?
Ela retira sua mão da dele e responde, depois de um segundo, em voz bem baixa:
- Estou... mas eu já falei: não é problema seu.
Wagner afasta-se dela e encosta-se à cadeira passando as mãos no rosto.
- Como não é? E é de quem?
- É meu! Só meu, coloque isso na sua cabeça, por favor.
- É do tal cara que você diz que gosta? Me diz que é.
- Se isso te deixa mais feliz e aliviado... é, é dele, sim, ela diz, com um sorriso.
- Mas isso ainda não me convence. Você... já estava grávida na festa, é isso?
Gerson, o cozinheiro da lanchonete, aproxima-se trazendo os dois pratos numa bandeja, acompanhados por saladas.
- Bom apetite crianças. Como está seu pai, Wagner? Faz tempo que não o vejo.
- Está ótimo. Na lida, como ele mesmo diz.
- Mande lembranças pra ele e dona Magda.
- Mando sim, Gerson. Obrigado.
O rapaz se afasta e Wagner volta a olhar para Mônica que já começou a temperar a salada para os dois.
- Isso aqui deve estar muito bom! Estou morrendo de fome, ela diz, animada.
- Mônica...!
- Vamos comer primeiro, por favor! - ela fala, unindo as mãos em prece.
- Pode comer. Eu não estou com fome.
- Olha pra esse bife, Wagner! Você não vai desrespeitar o coitadinho do boi que deu a vida para que ele existisse, vai? Seu pai cria gado também.
- Meu pai cria gado leiteiro e não de corte. São vacas, não bois e...
- Não sou fazendeira nem entendo disso, só sei que esse bife deve estar delicioso!
Wagner passa a mão pelo rosto e acaba rindo.
- Você é mais lisa que estrada de terra em dia de chuva na fazenda.
- Eu só não quero mais falar sobre isso. Quero almoçar. Você quer que eu desmaie aqui no meio da lanchonete?
Ela coloca na boca um pedaço do bife e fecha os olhos, mastigando com gosto. Ele começa a comer também e o assunto para por ali.
RETORNO AO PARAÍSO – ERA UMA VEZ... EM CASA BRANCA
PARTE 3